OPINIÃO JOGO ABERTO: 28/03/2017
Sua excelência, o foro privilegiado
A judicialização excessiva de temas absolutamente políticos, a tortuosa postura legislativa do Judiciário, em especial do Supremo Tribunal Federal, a baderna gerada pelo uso de leis e decretos forjados para a solução muitas vezes do insanável são justificativas da lesiva morosidade nas respostas de um Poder, que a sociedade brasileira tem como o último estágio do que lhe resta de fé em sua relação com o Estado. Mal ou bem, lento, inacessível para muitos, é do Poder Judiciário que emergem soluções reparadoras da insegurança jurídica gerada pelo despreparo e muitas vezes pelo casuísmo de nosso Congresso. Ainda que socorrido pelos efeitos da eficácia vinculante, o STF tem uma demanda impossível de ser atendida pelo trabalho de seus ministros, realidade agravada pelo rito imposto por nossa legislação processual. Daí decorre a necessidade apregoada aos quatro cantos de imediata reforma da atual Constituição.
Para entorpecer ainda mais essa realidade, é no STF que serão discutidos os processos de mais de uma centena de políticos que hoje se encontram na alça de mira da Justiça, resultado das quase 40 fases da operação Lava jato. Sem qualquer dúvida da participação criminosa de muitos dos delatados, reforçada por um elenco de provas que não deixam dúvidas do cometimento de seus delitos, o que esperam esses políticos é o benefício oferecido pelo instituto da prescrição da pena. Eles sabem que, entupido de processos, o STF lhes dará absolvição final. Porque não há outra expectativa; senadores e deputados federais são réus protegidos pelo foro privilegiado. Deliciosamente (para eles), é para essa classe de réus que o STF lavrará a sentença final, reconhecendo sua impunibilidade porque seus crimes certamente estarão prescritos. O foro privilegiado é a mais flagrante admissão da incompetência técnica dos magistrados de primeira e segunda instância. Não servem tais juízes e desembargadores para julgar deputados e senadores, mas têm poder e voz para atuar na solução de conflitos que envolvem o patrimônio e a liberdade, enfim, a vida de cidadãos comuns, esses que pagam impostos, que contribuem décadas para conseguir aposentar-se e ao final poderem receber miserável pensão. Não têm foro privilegiado também os cidadãos comuns que pagam seus aluguéis, que não recebem falsas dotações de duvidosa destinação, as chamadas “verbas indenizatórias”. Não têm foro privilegiado os empresários que empreendem, que geram empregos, que correm riscos de uma economia em frangalhos, que sustentam com o próprio trabalho, e o de seus colaboradores, seus negócios para, ao fim, pagar moeda por moeda os impostos que formam uma das maiores cargas tributárias do mundo. Resumidamente, só têm foro privilegiado aqueles que têm medo da ação da Justiça, os que não querem que não sejam julgados seus crimes comuns de corrupção, de lavagem de dinheiro, de formação de quadrilha, de falsidade ideológica, de enriquecimento ilícito, enfim, tudo que magistrados de primeira e segunda instância se ocupam de diariamente julgar quando réus são cidadãos comuns. Refugam-se a igualdade e a equidade, princípios fundamentais de toda Constituição democrática. E, lamentavelmente, contra isso não soam panelas.
por Marco Aurélio