OPINIÃO JOGO ABERTO: 05/04/2017
Falta justiça
Esperança de todo cidadão como Poder capaz de equalizar o atendimento as demandas da sociedade, gerir e solucionar conflitos, o Judiciário acumula um questionamento histórico de sua ineficiência, em todos os níveis em que está presente. Uma realidade formada por altos custos da prestação jurisdicional, pelas demoras insuportáveis da instrução processual, tudo reforçado por infindáveis recursos, muitos apenas de caráter protelatório, obrigando partes, magistrados e servidores a cumprir longas esperas, num verdadeiro calvário para se alcançarem soluções.
A resposta sempre esteve em sua alegada falta de estrutura, decorrente de Orçamentos insuficientes porque decotados pelo Poder Executivo, implicando carência de pessoal, no precário estado de suas instalações e de equipamentos auxiliares, cuja conjugação resulta na impunidade e na injustiça. Esse é um quadro conhecido pela sociedade brasileira. Todos nós, cidadãos, dele padecemos; para amenizá-lo, carecemos ainda da reforma dos códigos, cuja prioridade não nos parece compor a agenda de nossos congressistas. Se não conseguimos sequer colocar em discussão fragmentos de tantas aberrações, como, por exemplo, o foro privilegiado, que expectativa teríamos de exercitar outras reformas? Mas as incongruências não param aí.
Nessas últimas semanas, a Presidência da República, num bem-arranjado jogo de poder, preencheu duas vagas de ministro nos tribunais superiores, uma no STF e outra no TSE, com nomes retirados do bolso do colete. Um é Alexandre de Moraes, ex-ministro da Justiça do governo Temer, o mesmo que, numa noite anterior a sua sabatina pelo Senado Federal, reunira-se para um bate-papo informal com senadores num barco no lago Paranoá, sugerindo, no mínimo, a promiscuidade, comum na relação de membros dos Poderes do Estado; um escárnio, como afirmaram muitos que criticaram tal deslize, mas que em nada afetou sua ida para o STF. Outro ministro gestado pelo governo Temer é Admar Gonzaga, que ocupará a vaga de Henrique Neves a partir do dia 17 próximo. Embora já dito que o novo ministro não votará no processo em que a chapa Dilma-Temer poderá ser cassada, ele estará lá, bem sentado, pronto para dar seu pitaco. Na semana anterior, assistimos à prisão de conselheiros do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro (tribunais de Contas não são órgãos do Poder Judiciário) por suspeita de favores prestados a membros do Executivo fluminense, em troca de propinas, por meio de decisões interpretadas como quem fizera vista grossa a dezenas de atos administrativos que talvez não passassem despercebidos a qualquer delegado de polícia. Conselheiros dos tribunais de Contas são escolhas pessoais de governadores; sempre caberá a tais conselheiros o exame das contas dos mesmos governadores, em alguns casos daqueles que os nomearam.
No plano dos Estados, desembargadores e procuradores gerais de Justiça são também escolhas de seus governadores; no plano federal, igualmente, ministros dos tribunais superiores e do Tribunal de Contas da União são escolhas do presidente da República. Por que nunca se pensou em outros critérios para provimento desses cargos? São todas funções eminentemente técnicas, que certamente seriam mais bem prestadas por quem se submetesse a algum processo de mensuração de sua qualificação moral e intelectual. É exagerada tal pretensão?
por Marco Aurélio