Morre o poeta Ferreira Gullar no Rio de Janeiro
Gullar era membro da Academia Brasileira de Letras (ABL) desde 2014
São Paulo – O poeta Ferreira Gullar morreu na manhã deste domingo no Rio de Janeiro (RJ) no Hospital Copa D´Or, onde ele estava internado há 20 dias por insuficiência respiratória, segundo o jornal Folha de S. Paulo. A informação foi confirmada a EXAME.com pela diretoria do hospital.
Gullar foi eleito em 2014 para ocupar a 37ª cadeira da Academia Brasileira de Letras. Natural de São Luiz do Maranhão, nasceu em 10 de setembro de 1930 como José de Ribamar Ferreira. Em 2002, foi indicado ao Nobel de Literatura.
Veja a íntegra de sua biografia publicada no site da ABL:
“Ferreira Gullar, cujo nome verdadeiro é José de Ribamar Ferreira, nasceu em São Luís do Maranhão, em 10 de setembro de 1930, numa família de classe média pobre. Dividiu os anos da infância entre a escola e a vida de rua, jogando bola e pescando no Rio Bacanga. Considera que viveu numa espécie de paraíso tropical e, quando chegou à adolescência, ficou chocado em ter que tornar-se adulto, e tornou-se poeta.
No começo acreditava que todos os poetas já haviam morrido e somente depois descobriu que havia muitos deles em sua própria cidade, a algumas quadras de sua casa. Passou então, já com seus dezoito anos, a frequentar os bares da Praça João Lisboa e o Grêmio Lítero-Recreativo, onde, aos domingos, havia leitura de poemas.
Descobriu a poesia moderna apenas aos dezenove anos, ao ler os poemas de Carlos Drummond de Andrade e Manuel Bandeira. Ficou escandalizado com esse tipo de poesia e tratou de informar-se, lendo ensaios sobre a nova poesia. Pouco depois, aderiu a ela e adotou uma atitude totalmente oposta à que tinha anteriormente, tornando-se um poeta experimental radical, que tinha como lema uma frase de Gauguin: “Quando eu aprender a pintar com a mão direita, passarei a pintar com a esquerda, e quando aprender a pintar com a esquerda, passarei a pintar com os pés”.
Ou seja, nada de fórmulas: o poema teria que ser inventado a cada momento. “Eu queria que a própria linguagem fosse inventada a cada poema”, diria ele mais tarde. E assim nasceu o livro que o lançaria no cenário literário do país em 1954: A Luta Corporal. Os últimos poemas deste livro resultam de uma implosão da linguagem poética, e provocariam o surgimento na literatura brasileira da “poesia concreta”, de que Gullar foi um dos participantes e, em seguida dissidente, passando a integrar um grupo de artistas plásticos e poetas do Rio de Janeiro: o grupo neoconcreto.
O movimento neoconcreto surgiu em 1959, com um manifesto escrito por Gullar, seguido da Teoria do não-objeto, estes dois textos fazem hoje parte da história da arte brasileira, pelo que trouxeram de original e revolucionário. São expressões da arte neoconcreta as obras de Lygia Clark e Hélio Oiticica, hoje nomes mundialmente conhecidos.
Gullar, por sua vez, levou suas experiências poéticas ao limite da expressão, criando o livro-poema e, depois, o poema espacial, e, finalmente, o poema enterrado. Este consiste em uma sala no subsolo a que se tem acesso por uma escada; após penetrar no poema, deparamo-nos com um cubo vermelho; ao levantarmos este cubo, encontramos outro, verde, e sob este ainda outro, branco, que tem escrito numa das faces a palavra “rejuvenesça”.
O poema enterrado foi a última obra neoconcreta de Gullar, que afastou-se então do grupo e integrou-se na luta política revolucionária. Entrou para o partido comunista e passou a escrever poemas sobre política e participar da luta contra a ditadura militar que havia se implantado no país, em 1964. Foi processado e preso na Vila Militar. Mais tarde, teve que abandonar a vida legal, passar à clandestinidade e, depois, ao exílio. Deixou clandestinamente o país e foi para Moscou, depois para Santiago do Chile, Lima e Buenos Aires.
Voltou para o Brasil em 1977, quando foi preso e torturado. Libertado por pressão internacional, voltou a trabalhar na imprensa do Rio de Janeiro e, depois, como roteirista de televisão.
Durante o exílio em Buenos Aires, Gullar escreveu Poema Sujo – um longo poema de quase cem páginas – que é considerado a sua obra-prima. Este poema causou enorme impacto ao ser editado no Brasil e foi um dos fatores que determinaram a volta do poeta a seu país. Poema Sujo foi traduzido e publicado em várias línguas e países.
De volta ao Brasil, Gullar publicou, em 1980, Na vertigem do dia e Toda Poesia, livro que reuniu toda sua produção poética até então. Voltou a escrever sobre arte na imprensa do Rio e São Paulo, publicando, nesse campo, dois livros Etapas da arte contemporânea (1985) e Argumentação contra a morte da arte (1993), onde discute a crise da arte contemporânea.
Outro campo de atuação de Ferreira Gullar é o teatro. Após o golpe militar, ele e um grupo de jovens dramaturgos e atores fundou o Teatro Opinião, que teve importante papel na resistência democrática ao regime autoritário. Nesse período, escreveu, com Oduvaldo Vianna Filho, as peças Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come e A saída? Onde fica a saída? De volta do exílio, escreveu a peça Um rubi no umbigo, montada pelo Teatro Casa Grande em 1978.
Mas Gullar afirma que a poesia é sua atividade fundamental. Em 1987, publicou Barulhos e, em 1999, Muitas Vozes, que recebeu os principais prêmios de literatura daquele ano. Em 2002, foi indicado para o Prêmio Nobel de Literatura”.
Veja a sua lista de obras:
Poesia
Um pouco acima do chão – 1949
A Luta Corporal – 1954
Poemas – 1958
João Boa-Morte, Cabra Marcado para Morrer (cordel) – 1962
Quem Matou Aparecida? (cordel) – 1962
A Luta Corporal e Novos Poemas – 1966
Por você, por Mim – 1968
Dentro da Noite Veloz – 1975
Poema Sujo – 1976
Na Virtigem do Dia – 1980
Crime na Flora ou Ordem e Progresso – 1986
Barulhos – 1987
Formigueiro – 1991
Muitas vozes – 1999
Crônica
A Estranha Vida Banal – 1989
Infantil e juvenil
Um Gato Chamado Gatinho – 2000
O Menino e o Arco-íris – 2001
O Rei que Mora no Mar – 2001
O Touro Encantado – 2003
Dr. Urubu e Uutras Fábulas – 2005
Conto
Gamação – 1996
Cidades Inventadas – 1997
Memória
Rabo de Foguete – 1998
Biografia
Nise da Silveira – 1996
Ensaio
Teoria do Não-Objeto – 1959
Cultura Posta em Questão – 1965
Vanguarda e Subdesenvolvimento – 1969
Augusto dos Anjos ou Morte e Vida Nordestina – 1976
Uma Luz no Chão – 1978
Sobre Arte – 1982
Etapas da Arte Contemporânea: do Cubismo à Arte Neoconcreta – 1985
Indagações de Hoje – 1989
Argumentação Contra a Morte da Arte – 1993
Relâmpagos – 2003
Sobre Arte, sobre Poesia – 2006
Teatro
Se Correr o Bicho Pega, se Ficar o Bicho Come – 1966 – com Oduvaldo Vianna Filho
A saída? Onde fica a Saída? – 1967 – com Antônio Carlos Fontoura e Armando Costa
Dr. Getúlio, Sua Vida e Sua Glória – 1968 – com Dias Gomes
Um rubi no umbigo – 1978
O Homem como Invensão de si Mesmo – 2012