Opinião Jogo Aberto – 08 de Agosto de 2018
O eleitor enxerga agora, e mais ainda enxergará nas próximas semanas, os horrores gerados pela normas eleitorais vigentes. O eleitor enxerga agora, e mais ainda enxergará nas próximas semanas, os horrores gerados pela normas eleitorais vigentes.
Embora já alertado, vale lembrar que o Congresso Nacional piorou absurdamente seu conteúdo, perdendo figuras intelectualmente relevantes e eticamente comprometidas, substituídas a cada legislatura por elementos que fazem de tudo, menos aquilo que a população gostaria e a Constituição permite.
Perderam-se, como nunca, a confiança e a estima. O conceito da instituição se encontra destruído, taxado de medíocre e imoral, estarrece cinco continentes e esquimós do polo Ártico.
Raros parlamentares trafegam em público sem enfrentar hostilidades e insultos.
Alguns, que já foram planetas resplandecentes do firmamento político, agora lutam agarrados ao último orbital do sistema. Permutaram o brilho e calor de Vênus pela opacidade e frieza de Plutão. Decorrente da reprovação, e por questão de derradeira sobrevivência, o Congresso Nacional adotou a fórmula do tapetão para se salvar, rasgando o último fio de vergonha.
As regras eleitorais se limitam a um jogo de cartas marcadas, ampliando as prerrogativas dos partidos e de quem tem cargo; paralelamente restringiram-se a liberdade democrática e a possibilidade de manifestação do eleitor.
Proibiu-se a alternativa de candidaturas avulsas, expressão mais alta da liberdade do cidadão, manteve-se o voto obrigatório, instalou-se a impossibilidade de financiar com recursos pessoais a própria campanha (depois anulada pelo STF), deram-se R$ 2 bilhões aos partidos e aos parlamentares, além de outras sutilezas que favorecem o status quo.
O incorreto prevaleceu. Numa ponta amplia-se a imoralidade, na outra amputa-se a moralidade. Regras mais irreais, espúrias, mesquinhas, vergonhosas foram estudadas e aprovadas num acordo de votação simbólica. Os caciques de direita e até da extrema esquerda acordaram.
“Interna corporis”, prevaleceu o instinto de preservação. O pragmatismo que se instala num naufrágio sem diferença de credo e cor.
Deram-se poderes ditatoriais e imorais aos presidentes dos partidos, aqueles que nomeiam na direção parentes e laranjas, sugam os fundos partidários e vendem horário de televisão, a cabeça de seus candidatos e arregimentam figuras pitorescas para, somadas, eleger gente de pouca consistência.
A situação orgiástica faz enjoar os eleitores; nunca como agora os jovens de 16 e 17 anos se desinteressaram de exercer o direito ao voto e deixaram de tirar o título de eleitor.
Os horrores eleitorais são confortados quase sempre pelo STF, que, de guardião das leis, passou a legislar, atribuindo-se esse poder abandonado por um Congresso ocupado e absorvido em se locupletar.
Veja-se o enterro frustrante da revogação da imprescritibilidade dos danos ao erário, aprovada por 6 votos a 2 pelo STF na quinta-feira. Um dispositivo constitucional que cabe ao Congresso alterar. O Congresso se insurgiu? Não, pois com isso a Lava Jato morreu, as celas de Curitiba se esvaziarão, e os butins surrupiados por políticos e empreiteiras, que arrombaram o país antes de 2014, serão intocáveis.
Os principais partidos chafurdam nas negociações de partilhas, custe o que custar, no afã de sobreviver à catástrofe. Com a rejeição avassaladora, em média de três a sete vezes superior à admiração detectada pelas pesquisas de opinião, a maior preocupação é castrar neste momento as esperanças, retirar de cena quem pode incomodar.
Esse jogo macabro não é visível nem compreensível à massa dos eleitores; os comentaristas políticos escalados a julgar o bem e o mal olham mais a palha nos olhos alheios do que a tora que os cega. Entre a camada mais esclarecida da população abaixo dos 45 anos, a revolta cresce contra os governos em falência, junto com o desejo de abandonar definitivamente o Brasil.
Os partidos que fizeram sonhar as últimas gerações e se alternaram no poder chegaram a concordar recentemente com as listas fechadas, com um fundo de R$ 12 bilhões a cada campanha eleitoral (algo irresponsável e imoral, que daria por parlamentar R$ 20 milhões em verbas arrancadas dos contribuintes). Se não fosse a indignação da opinião pública, o projeto de lei de um parlamentar do PSDB de Minas teria sido aprovado por avassaladora maioria, estuprando o erário. Mantiveram R$ 2 bilhões e determinaram a impossibilidade de financiar com recursos próprios as campanhas de quem não tem cargo algum.
As pesquisas mostram que 50% da população pretende anular seu voto e quase 80% dela não votará nos atuais congressistas. Dessa forma, pode-se esperar o que aconteceu em 1990, quando os votos válidos em relação à eleição anterior, de 1986, devastaram o Congresso e varreram 40% do parlamentares. Neste ano, apesar do cerceamento imposto, a renovação poderá ser maior, com o voto nulo alcançando seu recorde.
Poderá criar-se, por essas leis, um Congresso de zumbis dos mantidos vivos pela legislação eleitoral, mas mortos pela insuficiência moral.
Por Marco Aurélio