Imagens de CPI indicam disparo ilegal de mensagens pelo WhatsApp
Imagens enviadas pelo ex-funcionário da Yacows Hans River do Rio Nascimento e exibidas nesta quarta-feira (19) na CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) das Fake News indicam que a empresa realizava disparos ilegais de mensagens pelo WhatsApp. As fotos foram anexadas às investigações da comissão que apura a disseminação de notícias falsas nas eleições de 2018.
Durante a sessão desta quarta, os parlamentares ouviram o depoimento de Lindolfo Alves Neto, o principal sócio da Yacows, empresa investigada na CPMI pelo disparo em massa na última disputa eleitoral.
As imagens mostram caixas contendo chips de celulares em cima de mesas da empresa, vários aparelhos conectados a um computador e com o WhatsApp Web aberto, além de fotos de monitores com registros de sistemas internos da companhia.
Em uma das imagens, é possível ler o início da frase “Urgente: Marcelo Odebrecht delata Fernando Haddad”.
Não é possível ver o resto da mensagem, mas, à época, houve um disparo de mensagem contra o candidato do PT à Presidência, Fernando Haddad, relativa à delação do empresário, que dizia: “Urgente- Marcelo Odebrecht delata Fernando Haddad recebeu propina grossa via Palocci (acabou a farsa)”.
Durante depoimento, que durou cerca de cinco horas, o empresário foi questionado sobre as imagens e reconheceu que as fotos foram tiradas dentro da sede da Yacows.
No entanto, ao ser confrontado com a imagem contendo a mensagem com ataques à campanha petista, disse desconhecer o conteúdo.
A legislação eleitoral permite que campanhas usem disparos coletivos de mensagem, desde que cadastradas e declaradas à Justiça Eleitoral.
No entanto, a lei eleitoral proíbe mensagens ou comentários na internet que ofendam ou prejudiquem a imagem de um candidato. O conteúdo deve ser exclusivo do candidato que contratou o serviço. É vedado qualquer tipo de ataque a adversários.
Alves Neto foi questionado diversas vezes ao longo do depoimento se tinha conhecimento dos conteúdos das mensagens que eram enviadas pela plataforma criada pela Yacows para disparos em massa. Na maioria das vezes, o empresário disse desconhecer o teor das mensagens.
Contudo, ao questionar se a empresa poderia ter disparado conteúdo com pornografia infantil ou fake news, negou, afirmando que fez uma auditoria no final de 2018 e não constatou nenhuma ilegalidade.
Alves Neto admitiu que a Yacows prestou serviços diretamente para ao menos 37 campanhas eleitorais, entre elas a de Henrique Meirelles (MDB) à Presidência, que custou R$ 2 milhões. Na lista encaminhada à CPMI aparecem ainda nomes como o dos deputados federais Tabata Amaral (PDT-SP), Paulo Abi Ackel (PSDB-MG), Samuel Moreira (PSDB-SP) e Rui Falcão (PT-SP).
Essas contratações foram declaradas ao TSE e são legais, como já relatou a Folha de S.Paulo.
Alves Neto também disse que Fernando Haddad e Jair Bolsonaro usaram indiretamente os serviços da Yacows, enquanto negou ter sido contratado pela campanha do ex-candidato Ciro Gomes (PDT).
Em relação à campanha de Bolsonaro, o empresário admitiu que o conteúdo foi apagado, embora tenha dito não saber quem fez isso. Em 2018, a empresa responsável pela estratégia digital da campanha do capitão reformado, AM4 Inteligência Digital, notificou extrajudicialmente a Yacows após registros serem apagados e o valor do serviço, estornado.
Aos integrantes da CPMI, Alves Neto confirmou que recebeu a notificação, mas que acreditava não ter respondido. “Isso tenho que verificar, porque nós desconhecemos por que foi apagado ou quem apagou”, afirmou o sócio da Yacows.
Em nota, a AM4 reafirmou que jamais apagou mensagens enviadas na plataforma, além de negar ter usado bancos de dados comprados para disparos de WhatsApp.
Durante a CPMI, os congressistas questionaram se o sócio da Yacows autorizaria a quebra de seus sigilos bancário e telefônico e encaminharia os contratos firmados com outras empresas, como a AM4, em 2018.Alves Neto, porém, alegou ter sido orientado por seu advogado a negar o pedido.
Os congressistas investigam como a Yacows obteve CPFs de idosos usados para registrar chips de celular e garantir o disparo de lotes de mensagens em benefício de políticos.
Em dezembro de 2018, a Folha de S.Paulo revelou, com base em documentos e depoimento de Hans River, o uso de nome e CPF de idosos para registrar chips de celular e garantir o disparo de lotes de mensagens em benefício de políticos.
Após dar entrevista e fornecer evidências à Folha de S.Paulo, Hans River, ex-funcionário da Yacows, fez um acordo com a empresa, incluindo termo de sigilo, e pediu para retirar o que havia dito.
As imagens e documentos incluídos no processo e enviados à reportagem mostravam um frenético trabalho no período eleitoral.
A legislação exige o uso de cadastro de CPFs existentes para liberar o uso de um chip. Como o WhatsApp bloqueia números que enviam grande volume de mensagens para barrar spam, as agências precisavam de chips suficientes para substituir os que fossem bloqueados e manter a operação.
O ex-funcionário encaminhou à Folha de S.Paulo uma lista de 10 mil nomes de pessoas nascidas de 1932 a 1953 (de 65 a 86 anos) que, de acordo com ele, era distribuída pela Yacows aos operadores de disparos de mensagens.
No depoimento, o empresário disse desconhecer o uso de CPFs ilegalmente para disparo de mensagens de WhatsApp durante as eleições.
Ele apresentou um vídeo afirmando ser possível se conectar no WhatsApp sem o número do documento. Depois, porém, afirmou que 70% dos chips mostrados em fotos durante a CPMI são comprados de outras empresas que prestam serviços similares e que não saberia dizer se haveria algum CPF associado a esses dispositivos.
Questionado sobre a afirmação de Hans River de que os operadores recebiam uma lista de CPFs para validar os chips, Alves afirmou desconhecê-lo. Instado a dizer se negava, ele repetiu que desconhecia.
O verbo desconhecer foi usado mais de 40 vezes durante o depoimento, sempre quando o sócio da Yacows era confrontado com situações que poderiam incriminar a atividade da empresa.
No início da sessão, seu advogado, José Caubi Diniz Júnior, recorreu à Constituição para garantir o direito de Alves Neto não jurar que falaria só a verdade para evitar produzir provas contra si.
O defensor citou seis investigações em curso em São Paulo, Brasília e na Justiça Eleitoral sobre as atividades da Yacows, e afirmou que o depoimento poderia comprometer a defesa do seu cliente.
“Vou insistir porque é incompatível um termo de compromisso e, ao mesmo tempo, não produzir prova contra si. O depoente quer colaborar, apenas não quer prestar depoimento com fundamento na Constituição Federal”, disse.
Na sessão desta quarta, os integrantes da CPMI ouviriam também outra sócia da Yacows, Flávia Alves, irmã de Lindolfo.
No entanto, como o depoimento do empresário se estendeu durante toda a tarde, eles decidiram adiar a convocação dela para depois do Carnaval, quando também serão analisados os 90 requerimentos ainda abertos, segundo o presidente da comissão, senador Angelo Coronel (PSD-BA).
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