Expectativa x realidade: afinal, Ganso ainda pode ser útil para o Fluminense? De que modo?
Uma das contratações mais celebradas pela torcida do Fluminense nos últimos anos, Paulo Henrique Ganso chegou ao clube em fevereiro de 2019 com status de candidato a ídolo. Um ano e meio depois, o camisa 10 vive fase difícil e tem sido alvo de críticas por parte da torcida. Depois de um começo promissor no clube, o meia atualmente é reserva com o técnico Odair Hellmann.
Ganso em treino do Fluminense — Foto: Lucas Merçon / FFC
Em um ano em que precisou fazer uma pré-temporada mais longa e teve pequenas lesões, Ganso voltou a ter mais chances recentemente. No entanto, ainda não conseguiu engrenar. Na última quarta-feira, entrou no 2º tempo da partida contra o Bragantino, mas não teve boa atuação na derrota por 2 a 1. Neste ano são 14 jogos, um como titular (314 minutos em campo), e nenhum gol ou assistência.
Ganso em Bragantino x Fluminense — Foto: Mailson Santana / FFC
Antes de qualquer cobrança, é preciso separar as expectativas da realidade. Ganso surgiu como fenômeno em dupla com Neymar no Santos no fim da década passada. Aliás, talvez o início de carreira tão avassalador faça com que as cobranças em cima dele por parte de imprensa e torcida sejam tão grandes – e às vezes até pesadas. Uma espécie de sentimento de “frustração” pelo jogador não ter se tornado aquilo que desejavam.
Neymar e Ganso foram campeões da Libertadores em 2011 pelo Santos — Foto: Grazir Junior / Globoesporte.com
O torcedor tricolor sabe, porém, que não se pode esperar do Ganso de 2020 aquele mesmo que explodiu no Santos. Mais do que os 30 anos de idade, as três cirurgias nos joelhos cobram seu peso. E testes de performance física no Flu mostram isso. Por outro lado, pessoas ligadas ao clube garantem que não falta dedicação – Ganso segue à risca a programação de treinos estipulada pelo departamento de futebol. Além disso, seu estilo de jogo é difícil de adequar às exigências de intensidade do futebol moderno.
Mesmo assim, sua presença sempre gera expectativa. E seu alto salário (cerca de R$ 400 mil mensais) e o longo tempo de contrato com o Flu (assinou até fim de 2023 como forma de diluir o alto salário que recebia na Europa para se adequar à realidade do clube) contribuem para a cobrança por um retorno técnico. Mas, afinal, Ganso ainda pode ser útil ao Tricolor? E de que modo?
Ganso em desembarque para se apresentar ao Fluminense no começo de 2018 — Foto: Mailson Santana / FFC
A qualidade no passe e a visão de jogo ainda estão lá. E seu começo pelo Tricolor no ano passado foi promissor. Marcou dois gols em seus primeiros sete jogos, com direito a um de barriga como o primeiro, sobre o Ypiranga, e um em clássico, contra o Botafogo.
Ganso comemora gol sobre o Botafogo — Foto: André Durão
O melhor momento foi com o então técnico do time, Fernando Diniz, um dos principais entusiastas de sua contratação. O camisa 10 era peça-chave no esquema montado pelo treinador. Chegou, inclusive, a ser líder de passes rasteiros para finalizações, sua especialidade, no Brasileiro. Mas os companheiros de ataque, não conseguiam converter as chances em gol e ele terminou o campeonato com apenas uma assistência.
Top 5 passes rasteiros para finalização no Brasileirão 2019:
- 1º Everton Ribeiro (Flamengo) – 51 passes rasteiros
- 2º Rony (Athletico-PR) – 43
- – Cazares (Atlético-MG) – 43
- – Dudu (Palmeiras) – 43
- 5º Ganso (Fluminense) – 41
* Levando em conta todos os passes para finalização (rasteiros e aéreos), Ganso terminou em 18º, com 46 no total, empatado com Nenê em segundo no Fluminense, atrás apenas de Caio Henrique, com 54.
Com a chegada de Oswaldo de Oliveira, o estilo de jogo do time mudou. Substituído com frequência, o meia entrou em rota de colisão com treinador e chegou até a bater boca publicamente com o técnico. Com Marcão, por sua vez, Ganso voltou a ganhar espaço. Não chegou a ter exibições de destaque, mas, mesmo assim – e apesar da lesão na reta final do Brasileiro -, fechou a temporada com status de titular.
Oswaldo de Oliveira e Ganso batem boca em Fluminense x Santos — Foto: Ide Gomes / Agência Estado
A fase difícil se iniciou este ano. Odair tinha planos para começar a temporada com Ganso como titular. Porém, o meia se reapresentou com um desequilíbrio muscular e precisou fazer uma pré-temporada mais longa que os companheiros. Isso abriu espaço para Nenê, que agarrou a oportunidade com unhas e dentes. Decisivo e em fase artilheira, o veterano foi o melhor jogador do time antes da parada das competições e virou titular absoluto da posição.
Ganso fez trabalho de reequilíbrio muscular no começo de 2020 — Foto: Mailson Santana / FFC
Reserva, Ganso passou a entrar em alguns jogos no segundo tempo. E não tem conseguido destaque. Problemas físicos também atrapalharam. No início de março, quando, enfim, teria a oportunidade de ser titular diante do Madureira (Nenê foi poupado), o camisa 10 sentiu o joelho e desfalcou o time. No retorno das competições, com Nenê com Covid-19, teve a chance de começar jogando. Porém, não foi bem contra o Volta Redonda, pela Taça Rio. Na sequência, com lombalgia, ficou fora dos Fla-Flus finais do Carioca.
Ganso deixa o campo para ser substituído contra o Volta Redonda — Foto: André Durão
Ganso chegou a perder espaço para Michel Araújo e Miguel entre as opções de Odair, mas, voltou a recuperar terreno ao ser acionado no início do Brasileiro. Alternou boas entradas com uma atuação ruim no último jogo, quando pareceu sem ritmo de jogo.
O esquema utilizado por Odair nas finais do Carioca e nas primeiras rodadas do Brasileirão, com uma trinca de volantes, a princípio não favorece Ganso pela ausência do chamado “camisa 10 clássico”. Neste caso, teria que se encaixar como um dos dois volantes mais soltos (atualmente, Dodi ou Michel Araújo) para trabalhar na distribuição e tentando bolas em profundidade, sua especialidade. Defensivamente, apesar de não ser um marcador nato, costuma contribuir. Ano passado foi o sétimo do time com mais roubadas de bola no Brasileiro, 31. A questão é que não entregaria a intensidade e a movimentação exigida pelo treinador aos atuais titulares.
Já no 4-2-3-1 da partida contra o Bragantino, o time volta a ter um meia-armador centralizado. Nesta formação, porém, há a concorrência com Nenê na posição, apesar das características bem diferentes. Em qualquer um dos casos, é preciso analisar estratégias e adversários para saber em quais ocasiões seria possível aproveitá-lo da melhor forma.
E é preciso também que o meia corresponda. Para recuperar o espaço no Fluminense, Ganso precisará conseguir aproveitar as oportunidades que surgirem, já que os treinamentos são cada vez mais escassos devido à sequência de jogos. Pessoas ligadas a Odair afirmam que ele ainda conta com a experiência do meia em uma temporada atípica, com uma sequência intensa de jogos. E fontes próximas do camisa 10 garantem que o meia segue motivado em busca de recuperar seu espaço.
Ganso, Nenê, Fluminense — Foto: Lucas Merçon / Fluminense FC
O ambiente, particularmente, não tem sido problema. Ganso é querido pelos companheiros, tanto os mais veteranos, como Nenê e Fred, quanto os mais jovens, com quem costuma brincar bastante. Recentemente, o uruguaio Michel Araújo, seu concorrente por um lugar no meio de campo, falou de sua relação com o camisa 10:
– O Paulo Henrique Ganso foi um jogador que desde o primeiro dia falou comigo, ele fala muito bem espanhol, falando, ajudando sobre posição e sobre minha família também. E acho que isso ajudou muito para eu ficar tranquilo aqui no Brasil – contou o uruguaio.
Michel Araújo e Ganso em treino do Fluminense no começo da temporada — Foto: Mailson Santana / FFC
Um dos líderes do elenco, nem sempre compartilha da mesma visão do elenco e da direção nos bastidores. Na negociação do acordo de redução salarial em abril, por exemplo, foi um dos últimos a aceitar os moldes. Pouco ativo e discreto nas redes sociais, também chamou a atenção a ser um dos poucos a não compartilhar o manifesto feito pelos jogadores criticando a volta do Carioca. Nada, porém, que crie conflitos internos.
De personalidade introspectiva, Ganso tem estado longe dos holofotes nesta fase de pouco destaque. Sua última entrevista foi ao Esporte Espetacular em outubro de 2019. Já a última vez que concedeu coletiva pelo Flu foi em julho do ano passado.
Restando três anos e meio para o fim de seu vínculo com o Fluminense, Ganso convive em meio a torcedores que ainda sonham com sua afirmação e outros que não creem que ele ainda possa render com a camisa tricolor.
Recentemente, surgiram boatos de uma possível saída. Possibilidade que não tem sido discutida, no momento. O clube, inclusive, chegou a emitir um comunicado negando que queira se desfazer do jogador. Tampouco fez contato com o estafe do atleta sobre isso. Caso, porém, surja algum clube interessado, não é descartado que a situação seja analisada.
Com a promessa de um Brasileirão desgastante pela sequência de jogos e a permissão de cinco substituições por jogo, Ganso deve continuar tendo oportunidades para voltar a se firmar no Fluminense. Se até aqui sua história com o camisa tricolor ainda é discreta, o meia ainda tem em suas mãos – ou melhor, em seus pés – a chance de reescrevê-la.
- Ge