Censura sem noção. Polêmica envolve programa de rádio e administração municipal
A polêmica está formada. De um lado os apresentadores do programa de rádio Sem Noção alegando terem sido censurados pela administração municipal. Eles afirmam que o executivo teria proibido que o programa fosse realizado e transmitido ao vivo em um espaço público. De outro a administração municipal na pessoa do prefeito Leomar Patrício (PHS), acusa o apresentador Marco Aurélio de está utilizando a situação para atacar a ele e a seus aliados políticos. Tudo isso se deu em razão da emissão de uma Notificação emitida pelo gabinete do prefeito informando que não seria autorizada a realização do programa no local programado, porque os organizadores não atenderam as exigências legais para promover o evento.
De acordo com Marco Aurélio a vedação da administração a realização do programa na Praça do Bairro Bom Futuro deve ser considerada como censura e cerceamento a liberdade de expressão e de imprensa. O locutor argumenta que a apresentação do programa em espaço público não fere nenhuma lei e que se deu em razão do prefeito não aceitar as críticas feitas à administração e ainda da possibilidade de a população utilizar o espaço pra criticar a atual gestão. Marco Aurélio se diz indignado e consideram o ato arbitrário e contrário a liberdade de expressão e a livre manifestação. De acordo com ele a transmissão do evento aconteceria na praça do bairro Bom Futuro e seria realizado com link ao vivo com a utilização de equipamentos móveis, o que não demandaria necessidade de autorização para ocorrer. “Isso é um verdadeiro atentado à liberdade de expressão. Nosso programa tem cunho informativo e cultural, por isso também é uma censura à expressão artística e cultural”, desabafou Marco Aurélio.
Já o chefe do executivo, Leomar Patrício, utilizou-se de um programa em outra rádio da cidade para dizer que não houve censura, mas sim um cuidado da administração em preservar um espaço público que oferece riscos à população. O espaço ao qual o prefeito se refere trata-se da quadra da Escola Bom Futuro. De acordo com o pronunciamento do chefe do executivo a quadra em referência oferece riscos à vida das pessoas, por isso foi vetada a utilização do local, porém não houve impedimento de realizar o evento na praça.
Em matéria publica em um site local, que tem como fonte a “assessoria”, que fica subentendida como sendo assessoria do prefeito, Leomar teria dito que o programa Sem Noção foge a finalidade pública e que estaria utilizando o episódio para atacar a sua pessoa. De acordo com a nota o programa Sem Noção utiliza espaço na rádio para debochar de personalidades em evidências e de políticos da região. Afirma ainda o texto que não houve proibição de utilizar a Praça para realização do programa.
O programa Sem Noção é levado ao ar nas manhãs de sábado na rádio 97,9 FM e tem como apresentares os locutores Marco Aurélio e Benhur Carmona. O programa de entretenimento e informativo é bem humorado e costuma satirizar notícias que considera de interesse da comunidade, não poupando personalidade e muito menos políticos do município.
ENTENDA O CASO
A fim de realizar o programa de rádio Sem Noção, transmitido ao vivo diretamente do Bairro Bom Futuro, a equipe do programa iniciou a divulgação do evento através da rádio onde o programa é levado ao ar. A administração municipal entendeu que o programa seria realizado na quadra da Escola Bom Futuro. Porém, segundo o apresentador Marco Aurélio o programa seria realizado na Praça do mesmo bairro.
Ao tomar conhecimento do evento a prefeitura emitiu uma Notificação, endereçada a rádio 97,9FM, onde dizia que a pretensão em promover o evento na quadra da escola não seria autorizada. Segundo apuramos os organizadores não chegaram a formalizar um pedido de autorização.
No documento emitido pela prefeitura e assinado pelo chefe de gabinete Edemilson Farias da Silva, a administração utiliza-se do Código de Postura do município, Lei nº 517/2001, alíneas “a”, “b”, “c” e “d” para informar aos responsáveis pelo programa que a intenção de promover o evento não obedeceu às exigências necessárias para a obtenção de Alvará Provisório para ocupação de espaço público. No mesmo documento o chefe de gabinete informa que estaria programada para o mesmo dia do evento uma limpeza nos arredores da quadra. O referido documento foi protocolado na recepção da rádio na sexta-feira, dia 11/11/2017 às 18:41hs., às vésperas da realização do evento que seria no dia seguinte.
A Notificação diz que a administração municipal não concedeu autorização para realizar o evento na quadra da Escola, e que os responsáveis pelo programa poderiam ser multados em caso de desobediência. (veja documento na íntegra logo abaixo).
Fato que se deve registrar é que a administração trata de autorização para utilização da quadra da escola, enquanto o programa Sem Noção faz menção a praça do bairro. Independente das versões apresentadas pelas partes, o fato é que houve realmente a notificação (conforme cópia abaixo) e que o programa não foi transmitido do local onde os organizadores pretendiam.
O QUE DIZ O CÓDIGO DE POSTURA E A CONSTITUIÇÃO
Segundo o Código de Postura do município de Machadinho D’Oeste-RO, Lei nº 517, de 18 de julho de 2001. Argumento utilizado pela administração para vetar o evento.
SEÇÃO VI
Das Localizações de Coretos e Palanques em Logradouros Públicos
Art. 205 – Para comícios políticos, festividades cívicas, religiosas ou de caráter popular, poderão ser armados coretos ou palanques provisórios nos logradouros públicos, desde que a Prefeitura o autorize em requerimento de interessados.
Parágrafo Único – A autorização para instalar dependerá dos interessados:
a) obedecerem às especificações técnicas estabelecidas pela Prefeitura para a sua instalação;
b) não perturbarem o trânsito público;
c) proverem de instalação elétrica, quando de utilização noturna, obser-vada as prescrições do Código de Obras, Edificações e Instalações;
d) não prejudicarem o calçamento nem o escoamento das águas pluvi-ais;
e) procederem a remoção do coreto ou do palanque no prazo de 48 (Quarenta e oito) horas, a contar do encerramento do ato público.
E o que diz a Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988.
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;”
NOSSA OPINIÃO
A questão levantada pela polêmica em destaque deve ser interpretada de forma cuidadosa, uma vez que todos têm direito a se manifestarem colocando as suas alegações a fim de respaldar as suas atitudes. Que pese os argumentos das duas partes. Porém, eu como jornalista e fervoroso defensor da liberdade do cidadão, não posso deixar de emitir a minha singela opinião sobre o fato. Tentei fazer uma matéria totalmente imparcial, mas não tenho como deixar de me pronunciar sobre o fato, de acordo com a visão do que considero liberdade tanto de expressão, quanto da tão famigerada liberdade de imprensa.
Ressalto que procuramos colocar os fatos na matéria da forma como eles foram apresentados pelas partes e de acordo com as informações que conseguimos levantar. E peço aos leitores que tomem as suas próprias conclusões sobre o caso.
Mesmo tendo o ato da administração municipal buscado alicerce no art. 205, alíneas “a”, “b”, “c” e “d” do Código de Postura do município, que a nosso ver não dá respaldo nenhum para tal atitude. A suposta censura imposta ao programa Sem Noção fere de morte um dos direitos mais relevantes alcançados pelas sociedades livres, que é o da liberdade de manifestação e vai em desencontro com a Constituição Federal, afinal, ela “veta” qualquer tipo de censura, conforme expresso em seu Art. 5º. Neste esteio registro especialmente o que diz o inciso IX: “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”
A Constituição Federal é o mais alto livro de lei de uma nação. Nenhum decreto ou regulamento publicado por prefeitura municipal ou governo estadual pode ser contra o que está estabelecido na Carta Magna. Se houver confronto de normas em qualquer nível de lei, prevalece a ordem federal. Qualquer ato publicado em contrário é totalmente inconstitucional.
A liberdade de expressão é respeitada em praticamente todos os países do mundo e ir a sentido contrário a esse entendimento, certamente é ir contra o sagrado direito de liberdade. Todo cidadão é livre para expressar suas ideias, suas opiniões e, consequentemente, sua arte. Os espaços públicos, por sua vez, existem para que as pessoas o utilizem da forma como acharem melhor, desde que não o prejudiquem.
Proibir a realização de um evento de cunho informativo, cultural e social, além de ferir a liberdade de expressão que o cidadão tem, é completamente injustificável e até mesmo temerário. No entendimento geral todos são livres para se expressar como achar melhor, onde achar melhor e tendo ainda o direito da proteção do Governo. E nenhum regulamento tem o poder de ferir essa liberdade.
Permitir esse tipo de atitude é abrir precedentes para um retrocesso da democracia e do exercício do direito de liberdade. É escancarar uma porta para a censura. É ferir de morte a liberdade de expressão. Sem contar que é uma afronta a Constituição Federal.
Nesse contexto, a Constituição assegurou a mais ampla liberdade de manifestação do pensamento (arts. 5º, inciso IV e 220). No que tange especificamente à liberdade de imprensa, a Constituição é expressa: “nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, incisos IV, V, X, XIII e XIV” (art. 220, § 1º).
Registre-se que a liberdade de imprensa e a Democracia encontram-se em posição de reciprocidade. Onde houver liberdade de imprensa, haverá espaço favorável para o exercício e a consolidação do regime democrático. Ao reverso, onde estiver estabelecido um regime democrático, ali a imprensa encontrará campo propício para sua atuação. Nutrem-se, portanto, uma da outra, fortalecendo-se ambas em um processo contínuo, cujos benefícios serão colhidos pelo povo.
A liberdade de imprensa é para os veículos de comunicação o equivalente ao que a liberdade de expressão significa a uma artista. Não há como exercer os fundamentos do jornalismo e da comunicação em geral sem ampla e irrestrita liberdade em fazê-lo. O jornalismo deve atender à sociedade civil ao noticiar, informar, denunciar, escrever, detalhar tudo aquilo que é ou pode vir a ser de interesse público.
Desta forma, acredito que a decisão emanada pelo poder público careceu de um maior zelo com essas condições e a situação poderia ter sido mais bem avaliada. Caso tivesse ocorrido o rumo dessa prosa certamente seria outro e não teria causado tanta polêmica e criado essa situação no mínimo constrangedora e, no meu entendimento, totalmente desnecessária. Porém, o mais agravante, neste caso, é a conotação política que está tomando. Isso não só é prejudicial à administração, mas também ao programa Sem Noção, à rádio 97,9 FM e atinge ao cidadão comum, pois de uma forma direta ou indireta pode acabar em meio a uma briga desprovida de nexo ou propósito.
Por Dário Bagalo – DRT-RO 890
CONFIRA A ÍNTEGRA DA NOTIFICAÇÃO EMITIDA PELA ADMINISTRAÇÃO