As duas apostas de Lula por liberdade em meio a desgate da Lava Jato
Acostumado a sofrer derrotas no Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva espera novos julgamentos de pedidos de liberdade pela Corte com as esperanças renovadas, diante do intenso desgaste sofrido pela Operação Lava Jato nos últimos meses, desde que foram reveladas conversas comprometedoras atribuídas a procuradores federais e ao ex-juiz Sergio Moro (hoje ministro da Justiça) pelo site The Intercept Brasil.
Em um sinal positivo, Lula obteve este mês uma importante vitória no STF, quando o plenário barrou, por 10 votos a um, a transferência do ex-presidente da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba para um presídio comum em São Paulo.
No entanto, apesar dessa recente conquista e dos questionamentos sobre a legalidade da operação, as chances de o petista ser solto continuam incertas.
As maiores expectativas estão na análise de dois recursos – um que questiona a imparcialidade de Moro e outro que pede a suspeição da Força-Tarefa da Java Jato.
No entanto, esses dois habeas corpus, que têm potencial de anular processos e condenações contra Lula na 13ª vara de Curitiba, ainda não estão com data marcada para julgamento. Há ainda outros dois recursos, mas de menor importância, que serão julgados nesta e na próxima semana.
A grande questão que deve definir a soltura ou não de Lula é se os ministros que compõem a Segunda Turma do Supremo (Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Celso de Mello, Edson Fachin e Ricardo Lewandowski), responsável por analisar os recursos do ex-presidente, vão considerar autênticas e válidas como prova a favor de Lula as conversas reveladas pelo The Intercept Brasil – aparentemente extraídas da conta de Dallagnol no aplicativo Telegram.
Moro e procuradores da Lava Jato têm dito que não reconhecem a autenticidade das mensagens e que elas podem ter sido adulteradas por hackers. Já o The Intercept Brasil diz que recebeu o material de uma fonte anônima.
O petista acabou barrado da eleição presidencial do ano passado pela lei da Ficha Limpa, após o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) ter confirmado a condenação do petista por Moro. Depois, já em 2019, Lula foi considerado culpado também pelo STJ.
O recurso lista ainda outros argumentos para sustentar a parcialidade do então juiz, como sua decisão de decretar a condução coercitiva do ex-presidente em 2016, mesmo sem ter previamente marcado um depoimento – prática que contraria a legislação brasileira.
Moro, por sua vez, diz que condenou Lula baseado nas provas processuais, em julho de 2017, quando Bolsonaro ainda não era considerado um candidato competitivo. Ele argumenta que, naquele momento, não tinha como prever a vitória do atual presidente, nem o convite para ser ministro. Além disso, afirma que aceitou integrar o governo para fortalecer o combate à corrupção e ao crime organizado.
Depois das revelações do Intercept, a defesa apresentou um adendo afirmando que as conversas “denotam o completo rompimento da imparcialidade objetiva e subjetiva” do então juiz. Os diálogos, caso verdadeiros, indicam Moro teria dado conselhos ao Ministério Público quando era juiz, o que é proibido pela legislação brasileira.
A análise dos argumentos iniciais começou em dezembro de 2018, quando Cármen Lúcia e Fachin votaram contra a suspeição de Moro e a liberdade de Lula. No entanto, o julgamento foi interrompido por pedido de vista de Gilmar Mendes.
Após as revelações dos diálogos pelo Intercept, o ministro decidiu retornar o HC para julgamento, mas a turma acabou realizando apenas uma análise preliminar, em que uma proposta de soltura provisória de Lula sugerida por Mendes foi barrada por 3 a 2 (votos contrários de Fachin, Celso de Mello e Cármen Lúcia).
Na ocasião, Celso de Mello disse que havia dúvidas sobre a autenticidade das conversas reveladas pelo Intercept, mas ressaltou que seu voto contra a soltura provisória de Lula não era uma antecipação de sua posição quando o HC sobre a suspeição de Moro voltar a ser julgado.
De lá pra cá, a Polícia Federal apreendeu, na Operação Spoofing, conversas de diversas autoridades brasileiras que teriam sido hackeadas por um grupo de criminosos. Esse material foi enviado ao STF após decisões dos ministros Luiz Fux e Alexandre de Moraes.
No entanto, não há qualquer informação sobre se o conteúdo foi submetido a uma perícia para averiguar sua autenticidade e se poderá ser usado como prova a favor de Lula.
2) Suspeição dos procuradores
No dia 13 de agosto, a defesa de Lula apresentou um novo pedido de habeas corpus (HC) 174398, agora pedindo a suspeição de Dallagnol e outros procuradores que integram a Força Tarefa da Lava Jato no Paraná. Se for aceito, esse recurso também pode levar à anulação das investigações e processos contra Lula na 13ª vara de Curitiba.
O recurso está nas mãos de Fachin, que é relator no STF de todos os casos contra Lula tocados pela Lava Jato do Paraná, e ainda não tem data para ser julgado na Segunda Turma.
Nesse HC, os advogados pedem também acesso aos diálogos apreendidos pela Operação Spoofing que se relacionem com o ex-presidente. Segunda a defesa da Lula, as conversas reveladas pelo Intercept Brasil “comprovam que investigações contra o ex-Presidente Lula foram iniciadas a partir de um comando emitido pelo ex-juiz Sergio Moro ao procurador da República Deltan Dallagnol sobre supostas propriedades destinadas aos filhos de Lula”.
Os advogados sustentam ainda que as mensagens mostram que “os procuradores da República sabiam que não havia qualquer prova efetiva contra Lula no caso do tríplex, tampouco vínculo com a Petrobras, mas a despeito disso, ofereceram denúncia e pediram a condenação do ex-presidente”.
Além desses argumentos, o recurso pede a suspeição dos procuradores por causa da realização de uma coletiva de imprensa, em setembro de 2016, em que Dallagnol exibiu uma apresentação de PowerPoint em que Lula aparecia no centro de um gráfico como líder de organização criminosa. Na visão da defesa, a Força Tarefa deu a Lula, na ocasião, “tratamento de culpado antes mesmo da instauração do processo”.
Esse argumento sobre a coletiva já foi negado por instâncias inferiores da Justiça como prova de suspeição dos procuradores – também nesse recurso a principal expectativa é se os ministros do STF levarão em conta as conversas reveladas pelo Intercept no julgamento.
3) Suspensão do processo sobre Instituto Lula
A Reclamação 33.543, que será julgada na próxima terça-feira, não tem potencial de colocar Lula em liberdade.
Nesse recurso, a defesa pede que seja suspenso o processo em que Lula é acusado de receber propina da Odebrecht por meio da compra de um terreno em São Paulo no valor de R$ 12 milhões, que seria usado para a construção de uma nova sede para o Instituto Lula.
Os advogados do petista pedem que o processo seja interrompido para que antes tenham acesso ao acordo de leniência firmado pela Odebrecht com o Ministério Público Federal e ao conteúdo dos sistemas Drousys e MyWebDay, usados pela empreiteira para comunicação e organização de pagamento de propinas.
Fachin já havia determinado que essas informações fossem disponibilizadas à defesa, mas a juíza Gabriela Hardt entendeu que os advogados do petista já tiveram acesso às informações relacionadas a esse processo.
4) Recurso no plenário virtual
Há ainda outro recurso relacionado ao processo do terreno do Instituto Lula que está em análise no plenário virtual da Segunda Turma até quinta-feira. Nesse sistema, os ministros têm uma semana para votar eletronicamente.
Nesse pedido, a defesa questiona a autorização para a realização de perícia em documentos que foram mantidos em sigilo durante o processo, sem que houvesse oportunidade da defesa de contestá-los.
Esse recurso também não deve levar à liberdade de Lula.
r7