Análise: estreia exige que Seleção saia do marasmo das arquibancadas para jogar bem
A seleção brasileira precisou sair do ritmo moroso da torcida para construir a vitória de 3 a 0 sobre a Bolívia na abertura da Copa América. Considerado o peso da estreia em casa sem o principal jogador, a equipe não sofreu, como de costume, mas demorou demais a criar movimentação que pudesse incomodar o frágil adversário, especialmente no ataque.
No primeiro tempo, as saídas de Firmino para os flancos não tiveram o complemento de David Neres e Richarlison, que deveriam ocupar seu espaço por dentro. Neres preso demais à ponta esquerda configurou um desperdício, muito diferente da naturalidade de sua movimentação no Ajax. Já Richarlison, um arrastador de defesas, entendeu melhor o jogo, mas sofreu tendo sempre dois marcadores no setor.
Outro bloqueio de posicionamento foi a presença de Fernandinho ao lado de Casemiro. A ideia de dar liberdade a Daniel Alves no primeiro tempo não se materializou. O lateral-direito, além de ter cometido erros incomuns, não encontrou o corredor aberto por Richarlison.
Richarlison tem se mostrado fundamental para a seleção brasileira — Foto: THOMAS SANTOS/AGIF/ESTADÃO CONTEÚDO
Era uma Seleção no ritmo de uma torcida que pagou caríssimo para não participar. Foram R$ 22 milhões de renda – a maior já divulgada no futebol brasileiro – gerados por um público que não fez pegar nem o grito de “olé”.
O intervalo foi providencial. As trocas de posição no ataque causaram danos na defesa boliviana. Assim, o Brasil entrou na área e conseguiu um pênalti bem marcado pelo VAR, a mão de Jusino, e bem batido por Philippe Coutinho. A partir daí o caminho se abriu.
Fernandinho foi solto por Tite. Transformou-se num segundo volante com chegada à área, tanto que teve duas oportunidades para finalizar e acionou Everton no lance do terceiro e derradeiro gol. Sua participação criou volume no campo ofensivo e obrigou a marcação da Bolívia, até então bastante cômoda, a ter mais um elemento a vigiar.
Para obter esse volume com poder de infiltração, Allan parece mais indicado, mas Tite preferiu não gastar uma substituição no setor.
Grupo comemora o primeiro gol de Everton pela seleção brasileira — Foto: Marcos Ribolli/GloboEsporte.com
Richarlison, David Neres, Coutinho e Firmino são jogadores muito móveis e versáteis para ficarem estáticos. Basta observar o segundo gol. São apenas os quatro contra cinco bolivianos, mas o simples fato de Richarlison estar centralizado para encontrar Firmino na direita, e Coutinho aproveitar a brecha de infiltração, deixa o rival desnorteado.
Registro importante: a iniciação do lance foi feita por Filipe Luís, jogador que leciona sobre tomadas de decisão. É raríssimo vê-lo cruzar a esmo quando deve trabalhar a bola pelo chão e é peculiar sua facilidade para encontrar linhas de passes para atacantes bem marcados.
A Seleção tende a ser pouco ameaçada na Copa América, um traço do trabalho de Tite que só foi quebrado no início avassalador da Bélgica na fatídica eliminação da Copa do Mundo. Alisson é um dos melhores goleiros do mundo – senão o melhor, a experiente linha defensiva tem vigor e qualidade, e a proteção de Casemiro é um porto-seguro.
A missão de Tite será fazer o time produzir e criar a partir do segundo homem de meio-campo, que deve voltar a ser Arthur, titular ferido por uma pancada no joelho, já a partir de terça, diante da Venezuela. O treinador pode conseguir isso estimulando a movimentação desses jogadores ou por meio de trocas. Everton substituiu Neres com apetite de quem busca uma vaga. Gabriel Jesus é o artilheiro desta Seleção. Há opções, e boas.
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