Opinião Jogo Aberto – 30 de Abril de 2020
O planejamento de longo prazo.
O governo federal enfrentará dificuldades para apresentar à opinião pública brasileira uma estratégia realista que possa articular as políticas compensatórias de curto prazo e, ao mesmo tempo, equacionar os impactos socioeconômicos da pandemia do coronavírus com as políticas de reformas institucionais de médio e de longo prazo, visando à retomada do crescimento econômico. Isto tem uma explicação.
Durante os últimos anos, o governo federal concentrou os seus recursos humanos e institucionais na formulação das políticas de curto prazo, ora no combate à aceleração inflacionária, ora no ajuste das contas públicas. Com a exceção solitária de algumas iniciativas setoriais de poucos órgãos da administração direta e indireta, as atividades de planejamento de médio e de longo prazo estavam sendo postergadas até o momento em que o Ministério do Planejamento foi absorvido pelo novo Ministério da Economia.
Para economistas que tiveram sua formação profissional estritamente nos mercados financeiros, onde, em geral, o que conta são as decisões de um dia após o outro, o planejamento de longo prazo pode ser considerado uma atividade supérflua. Grande engano, pois, como afirma Peter Drucker, o planejamento de longo prazo não lida com decisões futuras, mas com o futuro de decisões presentes.
Todo governo tem que dispor de estruturas de planejamento, que possam exercer as funções programáticas de mitigar, de compensar e de transformar. Mitigar determinados impactos maléficos e desastrosos, tais como aqueles provocados pelas mudanças climáticas.
Compensar muitas desigualdades sociais entre pobres e ricos, tais como a concentração da renda e da riqueza. Transformar estruturas produtivas anacrônicas com a incorporação de inovações científicas e tecnológicas.
O hábito que se criou nas burocracias estatais, desde o fim das últimas experiências de planejamento de longo prazo, no início dos anos 1980, de atuar através de uma sequência interminável de intervenções casuísticas não pode perdurar. Sem uma perspectiva de longo prazo em suas ações, os agentes e as instituições governamentais se entrelaçam nos mecanismos que eles próprios criaram e passam a ser conduzidos por uma espécie de processo acumulativo, aparentemente sem limites. Ao sobrepor ações de curto prazo, desencadeiam forças que não podem controlar, induzem efeitos inesperados, promovem desencontros e expectativas e chegam à perda de confiabilidade junto à opinião pública. O tempo da economia e o tempo da política se confundem, gerando decisões casuísticas ou oportunistas.
É preciso articular as políticas econômicas de curto prazo, de austeridade fiscal, por exemplo, com o planejamento de longo prazo, o qual funciona como uma lanterna de popa a orientar o que fazer e como fazer no curto prazo, sem comprometer os objetivos de longo prazo.
No caso presente, é necessário articular as políticas compensatórias indispensáveis durante o período de confinamento das famílias e de hibernação dos negócios, com uma política de expansão econômica pós-pandemia visando gerar renda e emprego num ambiente econômico com expectativas degradadas. Se nada for feito e continuarmos a fazer políticas econômicas de curto em curto prazo, poderemos chegar ao momento em que “Se você não sabe onde quer ir, qualquer caminho serve”.
Por Marco Aurélio